23 de setembro de 2011

Dona de casa


Tenho tentado ser dona de casa em Angola.
Como a grande maioria das mulheres modernas que conheço, não tenho lá tantos dotes culinários assim.
Fui buscar ajuda na internet. Me recomendaram blogs incríveis com dicas desde receitas, a idéias criativas sobre como organizar a mesa, decorar, etc.
Pensando em como ocupar o tempo comprei sementes para plantar um cheirinho verde: coentro, cebolinha, salsa. E ate mesmo flores para enfeitar o jardim.
Bom, começando pela jardinagem... Peguei também algumas plantas que gostei na beira da estrada e replantei. Passei horas cuidando da terra e depois molhando. No dia seguinte tudo murcho. Uma angolana chegou a ter pena de mim. Disse que as plantas que eu escolhi não iriam nascer. Um cubano riu e fez mímicas dizendo em espanhol que estavam muito murchinhas, que meu jardim já era.
Mesmo assim não desisti e fui plantar minhas sementinhas. Pelo menos uma parece que esta nascendo. Ja tentei ate conversar com elas. Bater um papinho amigo, mas por enquanto nada. Ate agora minha nota na jardinagem esta em 1 (pelo esforço apenas).
Quanto a culinária ate que me surpreendi. Achei que não cozinhava absolutamente nada. Mas já fiz algumas massinhas razoaveis, alguns bolos. Ate arroz saiu medio e meu arroz sempre foi péssimo. E a campeã foi a carne com molho de vinho. Mas já consegui uma nota 7. Que já é muito melhor do que eu esperava.
Principalmente pelos percalços que encontrei por aqui.
Pra começar todos aqueles sites fantásticos, cheios de receitas e truques... ESQUEÇA! A internet praticamente não funciona. Quando funciona é tão absurdamente lenta que eu desisto.
Depois vem a aventura do supermercado. Encontrar os produtos que procura. Ingredientes exóticos nem pensar. Nem posso reclamar porque isso ate tem melhorado bastante. Paga-se um absurdo, mas ate se encontram algumas coisas inesperadas. Qual não foi meu espanto quando encontrei pão de queijo congelado! Um sonho pra mim.
Ontem fui fazer um bolo. Sabia que em casa já tinha farinha de trigo, fermento. Comprei alguns outros ingredientes somente e fui pra cozinha.
Logo percebi que precisava fazer clara em neve. Mas é claro que não tinha uma batedeira em casa. E nem aquela molinha que se usa pra bater no braço mesmo. Então tive que bater com qualquer utensílio que encontrei pela frente. Acho que fiquei uns 40 minutos nesse sacrifício. Mas com minhas lindas claras em neve prontas, problema resolvido, ia continuar. Mas quem diz que encontrava a farinha e o fermento?!
Chamei a empregada que trabalha na casa:
_ A Senhora por acaso viu a farinha que estava aqui?
_ Sim, chefe. Eu levei pra minha casa.
Assim. Sem a menor cerimonia.
_ E o fermento?
_ Também levei.
_ E agora, como vou fazer aqui o bolo? Vou perder isso tudo aqui que já preparei?
_ Nao. Eu vou ali comprar e ja trago.
Muito provavelmente ela não tinha dinheiro e deve ter pendurado a despesa em algum mercadinho.
Meia hora depois, minha clara em neve já murcha feito as plantas no jardim, volta ela com um pacote de farinha e o fermento.
Eu sei que é triste a pessoa ter a necessidade de um pacote de farinha. Levar o seu desodorante, papel higiênico, detergente, água. Tudo isso acontece por aqui.
Na hora meu primeiro impulso é de raiva. Mas depois vem a pena mesmo.
_ Quando a senhora precisar de alguma coisa, peca antes. Não tem problema. Mas tem que pedir primeiro. Não pode levar assim. Senão acho que tem e começo a preparar. Ou então deixo de comprar no mercado porque penso que já tem.
Com certeza ela viu essas coisas e teve vontade fazer um bolo na casa dela. Pão, quem sabe…
Brigar ou demitir por isso pode virar até caso de policia. Você é quem vai parar na esquadra por racismo. Esta a comer e não deixa comer. Discriminação. Sem falar no mal estar com a comunidade que vai toda tomar partido dela.
Arrumar outra?! Trocar de problema.
Enfim, já não bastassem meus problemas pessoais como dona de casa ainda tenho que lidar com os sociais.
E o bolo?! Quem comeu disse que estava ótimo! :)

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